Inovação 21 de Abril de 2021

Entrevista ABRE: Desempenho da indústria de embalagens em 2020

O último ano foi marcado pela pandemia e exigiu adaptação, flexibilidade e agilidade de diversos setores econômicos e de toda a sociedade. Se por um lado alguns segmentos foram impactados negativamente, por outro, a indústria de embalagens, ligada diretamente aos setores considerados essenciais na pandemia, como alimentos, bebidas, farmacêuticos, higiene doméstica e personal care, apresentou um bom desempenho.

Segundo dados do Estudo ABRE Macroeconômico da Embalagem e Cadeia de Bens Consumo no Brasil, a indústria de embalagem cresceu 0,5% no ano passado, enquanto a indústria de transformação como um todo teve queda de – 4,6%. Ao todo, o valor da produção física de embalagem em 2020 foi de R$ 92.925 bilhões. Abaixo segue o gráfico do desempenho por material de embalagem:


Nesta entrevista, a gerente de Comunicação e Marketing da ABRE, Isabella Salibe, faz um balanço do desempenho da indústria de embalagens no último ano, fala sobre o movimento de inovação no setor, como o segmento tem acompanhado as mudanças dos hábitos de consumo e quais as expectativas e oportunidades que a Associação enxerga para o setor no mundo pós-pandemia. Confira!

 

1) Quais os principais aprendizados que o setor pode tirar deste período?
No início da pandemia havia um clima de incerteza, no qual as indústrias reduziram a produção e utilizaram os seus estoques, esperando uma queda no consumo. Porém isso não aconteceu: o consumo continuou acelerado, especialmente com a corrida dos consumidores aos supermercados. A grande maioria das grandes indústrias consumidoras de embalagem conseguiu virar a chave em tempo recorde e focar os seus esforços em itens de abastecimento, deixando os projetos de inovação para um outro momento. Entendemos que manter estoques de segurança deve permanecer como atitude de precaução por parte dos consumidores, sendo assim, embalagens que favoreçam a estocagem e que ofereçam maior prazo de validade se beneficiaram deste contexto.

Além da corrida aos supermercados, houve um crescimento sem precedentes do e-commerce e as embalagens de entrega passaram a ser protagonistas e precisaram ser repensadas: elas deixam de ser apenas algo que entrega e passam a ser algo que se comunica com o consumidor, pois é dela o papel de oferecer a primeira experiência de contato com o produto, tornando-se assim, mais relevante para os negócios. E não apenas o e-commerce cresceu, vimos também o boom dos deliveries de comida e nesse ponto a embalagem é fundamental para que a refeição chegue íntegra e com segurança à casa dos consumidores.

Outro ponto importante foi o aumento dos pequenos negócios. Com o fechamento de comércios, demissões, etc, muitas pessoas passaram a trabalhar por conta própria e um dos gargalos para esses pequenos empresários é a embalagem. As pequenas empresas precisam de acesso a indústrias capazes de fornecer embalagens de qualidade em tiragens reduzidas e, estar disponível a este público representa uma grande oportunidade para o setor de embalagem. É o momento de aproveitar para ampliar a presença junto aos pequenos negócios.


2) Em muitos setores da economia, a pandemia acelerou a digitalização e a adoção de tecnologias 4.0. Como você vê esse movimento de inovação na indústria de embalagens?
Realmente a transformação digital durante a pandemia caminhou a passos largos. Entretanto, não vemos esse movimento muito forte na indústria de embalagem. Existem algumas iniciativas para melhorar processos de gestão, de comercialização e na embalagem em si, como rótulos inteligentes, realidade aumentada, realidade virtual, internet das coisas, mas algo ainda incipiente. A transformação digital tem como objetivo transformar modelos de negócios e não vemos esse movimento na indústria de embalagem, que continua com as questões de tiragem, dificuldade de personalização, entre outros. 

Já na indústria de bens de consumo isso vem acontecendo com muito mais força. Empresas como Ambev, Nestlé e Coca-Cola, por exemplo, transformaram os seus negócios, aumentaram ainda mais a competitividade, melhoraram experiências de consumo, e isso foi proporcionado pela digitalização, ou seja, a tecnologia em si é o meio e não o fim, é ela que viabiliza transformações maiores.

De acordo com a consultoria de tecnologia McKinsey, a transformação digital pode ser caracterizada em uma empresa se ela acionar qualquer um destes gatilhos: 1) Modelos de negócio: criar novas formas de operação e de faturamento; 2) Conectividade: conquistar engajamento completo e em tempo real; 3) Processos: ter foco na experiência do consumidor, com uso de automação para melhorar entregas; 4) Analytics: adoção de uma cultura de dados para melhorar a tomada de decisão. Em maio, realizaremos um evento online para mostrar como essa transformação digital tem acontecido nas empresas, apresentando cases e exemplos de brand owners que conseguiram ressignificar os negócios, ganhar competitividade e qual a importância da cadeia de embalagem acompanhar esse movimento.


3) É possível fazer um comparativo entre o desempenho do mercado brasileiro de embalagens e do mercado internacional?
Pensando em termos de parque gráfico, maquinário e equipamentos, a indústria de embalagem no Brasil está alinhada ao mercado internacional. Entretanto, o consumidor brasileiro é bastante sensível a preço e isso se intensificou na pandemia. Assim, muitas inovações que poderiam ser implementadas nas embalagens brasileiras, como novas tecnologias, sistemas de abertura e fechamento, entre outros, e que causariam um aumento de preço, não foram implementadas, pois os consumidores acabam não comprando um produto que seja mais caro, por menor que seja a diferença. A maioria acaba comprando mais pelo preço do que pela conveniência ou diferencial que a embalagem possa trazer. 

Mas isso não quer dizer que a indústria de embalagem deva parar no tempo, muito pelo contrário. Ela deve insistir em trazer esse potencial e diferencial das embalagens, pois à medida que novas funcionalidades, tecnologias e matérias-primas são mais utilizadas, o preço também passa a ficar mais acessível e esse benefício se incorpora à realidade daquele produto. Porém, vale lembrar que é fundamental entender o que é valor para o consumidor do produto. Não adianta implementar uma nova tecnologia na embalagem, por exemplo, se isso não for percebido e valorizado pelo consumidor. Portanto, estar atento aos movimentos da sociedade e ouvir o consumidor final é crucial.


4) Os hábitos de consumo estão em constante mudança e isso ficou evidente com a pandemia. Na sua opinião, como o setor de embalagens tem acompanhado e se preparado para essas mudanças?
Historicamente, o setor de embalagem acompanha o desenvolvimento e a evolução da sociedade, pois ele está intrinsecamente ligado ao modo de vida das pessoas. Vimos isso quando as mulheres passaram a trabalhar fora de casa e houve uma explosão de lançamentos de alimentos congelados, de preparo rápido e outros produtos que oferecessem mais praticidade e conveniência. Vimos isso com produtos on-the-go, que acompanhou uma tendência de se alimentar em movimento, em transportes públicos, nos carros e em tantos outros momentos. E isso não foi diferente na pandemia. As marcas tiveram que rever os seus portfólios, repensar formatos, tamanhos, opções de entrega e a indústria de embalagem acompanhou a necessidade de seus clientes.


5) Quais as expectativas e oportunidades a ABRE enxerga para o setor no mundo pós-pandemia?
Como mencionei anteriormente, novos hábitos de consumo vieram para ficar e o setor de embalagem deve estar atento a eles. Não podemos esquecer, inclusive, do poder das redes sociais e como as embalagens podem estar inseridas nesse contexto. Segundo a Forbes (2018) cerca de 72% dos usuários fizeram as compras depois de ver o produto no Instagram. Ou seja, as redes sociais se tornaram vitrines para descobrir novos produtos e é onde a embalagem se torna a comunicação direta e uma experiência para o público. O unboxing das caixas são grandes exemplos do uso da embalagem para promover experiências, diferenciação e também criar um diálogo com os consumidores.

Outro ponto que vale ficar de olho: soluções de logística vêm ganhando novas dimensões, ajudando a criar valor de marca e a melhorar a experiência de compra do consumidor. As embalagens ganham destaque, ampliando seu papel neste novo momento. Para evitar problemas na logística de entrega com terceiros como atrasos, produtos danificados, etc., muitas marcas criaram seu próprio sistema de compra online e entregas. Com isso, conseguem um controle total da experiência e comunicam uma mensagem personalizada e direta.

Em resumo, as indústrias de embalagem precisam ser parceiras estratégicas de seus clientes. Precisam estar atentas a esses movimentos da sociedade para deixar de ser apenas um fornecedor passando a ser um player fundamental no momento de criação e desenvolvimento de novos produtos. O estabelecimento de alianças estratégicas entre a indústria de embalagem e seus clientes deve estar na pauta das empresas como um dos mais importantes pontos de atenção para 2021.


6) Como a ABRE vem articulando com seus associados iniciativas e projetos em prol da sustentabilidade?
Temos uma atuação forte no que tange à sustentabilidade há algum tempo. O Comitê de Sustentabilidade traz questões importantes a serem discutidas e também direcionamentos em todos os seus encontros. Em 2019, lançamos a Plataforma Caminhos da Sustentabilidade, um espaço que tem como objetivo estabelecer uma comunicação mais direta e amigável com o consumidor, mostrando para ele a importância da embalagem na preservação de alimentos, no transporte de produtos, na segurança e tantos outros quesitos fundamentais de uma boa embalagem.

Desde 2019 também realizamos o Fórum ABRE de Economia Circular, que traz um panorama do que está acontecendo de mais importante no Brasil em relação à sustentabilidade, do ponto de vista das indústrias, governo e sociedade. Atualmente, trabalhamos na captação de recursos para desenvolver o “Observatório da Reciclagem no Brasil”, um estudo da cadeia de valor da reciclagem das embalagens dos produtos de consumo das famílias. Entre os principais objetivos deste estudo está, por exemplo, mapear quais as embalagens apresentam viabilidade técnica e econômica para fluir na cadeia de reciclagem no Brasil. Além disso, estamos sempre atentos aos movimentos que acontecem no país e participamos das principais discussões sobre o tema em outras associações, entidades governamentais e na sociedade civil.